Em um julgamento que durou 15 horas e ocorreu na Câmara de Vereadores de Tijucas, com público restrito pelas medidas sanitárias contra a covid-19, o Conselho de Sentença do Tribunal atendeu integralmente à denúncia do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e condenou Rozalba Maria Grimes que matou a professora Flavia Godinho pra lhe retirar do ventre o filho de 36 semanas de vida, ainda em gestação.
A ré foi condenada por homicídio com cinco qualificadoras contra a mãe e por homicídio qualificado tentado (tentativa de homicídio) contra o bebê. Além disso, ela também deverá cumprir pena por mais quatro crimes relacionados aos dois homicídios.
As penas somadas chegam a 56 anos e 10 meses de reclusão em regime inicial fechado, mais oito meses de detenção. A ré pode recorrer da sentença, mas não em liberdade, pois já cumpre prisão preventiva pelos crimes e os motivos que levaram a essa medida continuam presentes, conforme determinou o Juiz José Adilson Bittencourt Júnior. Além, disso, pelo crime de homicídio, a pena foi superior a 15 anos de reclusão, o que também determina o cumprimento imediato da pena.
Após o julgamento, o Promotor de Justiça Alexandre Carrinho Muniz, que atuou em colaboração como integrante do Grupo Especial de Atuação do Tribunal do Júri (GEJURI) do MPSC, comentou a decisão dos jurados, que seguiram o entendimento do Ministério Público e consideraram a ré como plenamente consciente de seus atos e, por isso, mentalmente apta a pagar pelos crimes na Justiça.
“É o resultado de um trabalho que o Ministério Público fez, em conjunto com a Polícia Civil, em que nós conseguimos demonstrar não só a questão da materialidade e da autoria, que me pareceu bastante incontroversa, mas também de identificar – até por parte do IGP que fez um excelente trabalho na confecção do laudo de sanidade mental – que ela tinha plena capacidade entender o caráter ilícito dos fatos e também de ter controle sobre seus atos”, comentou.
A Promotora de Justiça da 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Tijucas, que atua nos julgamentos de crimes dolosos contra a vida no Tribunal do Júri, destacou o papel do Ministério Público em casos bárbaros e cruéis como este. No Júri Popular, é a própria sociedade, por seus representantes no Conselho de Sentença, quem julga os fatos, sempre dentro do que determina a lei e com o propósito de se fazer Justiça à vítima e aos seus familiares.
“Vemos com muita satisfação a forma como esse processo foi concluído depois de um árduo trabalho dos Promotores que atuaram nele – e aí me refiro ao dr. Alexandre Carrinho Muniz e à dra. Mirela Alberton, que trabalhou neste processo desde o início, na fase de investigação, até as alegações finais – e hoje tive a oportunidade de estar aqui, respondendo pela 1ª Promotoria de Justiça. A Justiça certamente foi feita”, completou.
ENTENDA OS CRIMES PELOS QUAIS ROZALBA FOI CONDENADA
Homicídio cinco vezes qualificado contra Flávia Godinho, subtração de incapaz e parto suposto.
No dia 27 de agosto de 2020, Rozalba preparou uma emboscada para matar a professora Flávia, que estava a poucos dias de dar à luz seu primeiro filho, com a intenção de lhe retirar o bebê da barriga e tomá-lo para si. Para consumar os seus planos, durante meses, Rozalba se aproximou da professora, que era apenas uma conhecida sua, e conquistou a sua confiança a enganando, mentindo que também estaria esperando um bebê.
Com isso, no dia dos crimes, Rozalba facilmente convenceu Flávia a acompanhá-la para uma surpresa – um chá de bebê (inexistente) que estaria sendo organizado por ela e as amigas da vítima. Flávia se deixou ser vedada e, sem ver o que a esperava, foi atacada por Rozalba, que golpeou a cabeça da vítima várias vezes.
Com a vítima inconsciente devido aos golpes, Rozalba usou um estilete para lhe abrir o ventre e extrair do útero de Flávia o filho, ainda em gestação. Flávia morreu devido à hemorragia causada pelo parto em condições precárias e realizado de forma brutal.
As circunstâncias do homicídio configuram as qualificadoras de motivo torpe, pela dissimulação, praticado com recurso que dificultou a defesa da vítima e com meio cruel, para possibilitar a prática de outro crime (subtração de incapaz e parto suposto) e feminicídio (já que a morte de Flávia está diretamente relacionada à sua condição do sexo feminino, devido à sua gravidez). A pena também foi aumentada, como pediu o Ministério Público, porque a vítima era gestante. Ela também foi condenada pela subtração do bebê de sua mãe verdadeira e por ter simulado o parto de seu filho, que nunca existiu.
TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO CONTRA O BEBÊ (HOMICÍDIO TENTADO DO NEONATO)
Como a criança foi gravemente ferida pelo estilete usado para retirá-lo do ventre de sua mãe, o bebê que ainda estava em gestação, quase morreu. Rozalba não tinha qualificação alguma para realizar uma cirurgia como uma cesariana, tampouco tinha a intenção de realizar tal procedimento. A acusada apenas queria retirar o bebê da barriga de Flávia e, com isso, colocou em risco a vida da criança de forma consciente, assumindo a possibilidade de matá-la. Além disso, o bebê nunca teria chance de se defender, circunstância que leva à qualificação deste crime como homicídio qualificado tentado, com o uso de recurso que tornou impossível a defesa da vítima.
FRAUDE PROCESSUAL E OCULTAÇÃO DE CADÁVER
Após cometer os crimes contra a vida da mãe e do bebê em gestação, Rozalba fez o que pode para acobertar os seus atos e prejudicar as investigações e o processo: escondeu o corpo de Flavia no forno de uma cerâmica, o que fez com que o cadáver só fosse encontrado no dia seguinte aos crimes e a vítima chegasse a ser dada como desaparecida. A ré também escondeu o celular da Flávia, onde havia certamente provas contra ela.
Informações e foto MPSC